Um documento interno da Polícia Militar de Minas Gerais prevê pontuações para os PMs que multarem motoristas e removerem veículos para o pátio. A Itatiaia teve acesso à íntegra de um memorando que trata do Programa Individual de Produtividade (PIP).
O documento foi apresentado em uma denúncia formalizada na Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta semana. O presidente da comissão, deputado Sargento Rodrigues (PL), classificou o caso como “aberração”.
Conforme o deputado, o sistema está sendo implantado pela Polícia Militar Rodoviária, responsável por fiscalizar as rodovias estaduais em todo território mineiro. A comissão recebeu denúncias de que o sistema de metas e pontuações, nos mesmos termos, também está passando a ser adotado por batalhões ostensivos, responsáveis por fazerem as seguranças das áreas urbanas dos 853 municípios mineiros.
No documento enviado pelos comandantes de diferentes batalhões de Minas, há um detalhamento das pontuações para cada tipo de ação do policial.
Os policiais são premiados, por exemplo, com 10 pontos por prender criminosos e apreender armas de fogo. Ao recuperarem celulares furtados e roubados, os policiais somam cinco pontos. Esses são quesitos que não incomodam os policiais e os parlamentares.
Mas, um dos pontos polêmicos é relacionado às infrações de trânsito. No mesmo documento, há pontuações específicas para ação dos policiais que multam motoristas e determinam a remoção de veículos, em Minas Gerais. Veja:
O chamado PIP prevê 0,5 ponto para os policiais que aplicarem multas em veículos. Para aprender e remover veículos para o pátio, a pontuação é mais alta: são dois pontos de bônus para o PM que realizar a ação.
Esses pontos são somados e geram benefícios no final do mês. No documento, a Polícia Militar lista os benefícios que policiais, que mais pontuarem, podem obter, desde folgas a “menção elogiosa”.
O presidente da Comissão de Segurança Pública, deputado estadual Sargento Rodrigues (PL), classificou a pontuação no sistema de metas como uma “aberração”. Segundo ele, as primeiras denúncias surgiram na cidade de Conselheiro Lafaiete, quando começou a circular um memorando que trata das pontuações em caso de ações realizadas pelos militares.
“Esses documentos internos da PM eles gostam muito de legislar, achando que são deputados. É uma aberração. Você incentiva a indústria da multa para ganhar folga, elogio ou nota meritória. Achei o cúmulo do absurdo e fiz a denúncia”, conta o parlamentar à Itatiaia.
A comissão chefiada pelo deputado convidou o comandante-geral da Polícia Militar do Estado, coronel Rodrigo Piassi, para tratar da denúncia. Na sessão ele confirmou a existência do programa de metas e defendeu o sistema de pontos para os policiais.
“O que os nossos Programas de Incentivo à Produtividade contém são pontos que levam a nossa tropa focar ações que nós precisamos realizar. Nenhuma delas extrapola as competências legais ou as prerrogativas que nós, policiais, temos. Não há que se dizer que estamos ferindo qualquer lei”, defendeu o chefe da Polícia Militar.
O comandante geral também confirmou que os policiais recebem pontos no sistema ao multar motoristas em Minas Gerais, mas ressaltou que não vê problemas nas ações, desde que os policiais não cometam excessos.
“Nós temos, de fato, em algumas cidades pequenas, aonde a rotina de trânsito incomoda muito a dinâmica social e nas unidades especializadas de trânsito urbano e rodoviário ações voltadas à fiscalização de trânsito e orientação. E todas elas seguem absolutamente as condutas e regras estipuladas pelo Código de Trânsito Brasileiro”, disse Piassi.
Para o comandante da PM, o assunto só deveria estar em debate na Assembleia caso o militar estivesse cometendo um crime.
“Entendo que, se um policial militar confeccionar um auto de infração de trânsito desobedecendo o que está previsto, aí sim devemos discutir isso aqui na Assembleia”, complementou.
Apesar da defesa de Piassi, o deputado Sargento Rodrigues afirmou que o programa é um incentivo à chamada “indústria da multa”. Segundo o parlamentar, os policiais afirmam têm denunciado que se sentem pressionados a pontuarem no sistema.
Sistema de pontuação provoca exposição, desconforto e competição entre policiais
Além de considerar inadequado “premiar” policiais por aplicarem multas de trânsito, Rodrigues afirma que o programa de punições está provocando “exposição, mal estar e competição entre policiais”.
O parlamentar disse à Itatiaia que o saldo de pontuações do mês do Programa Individual de Produtividade (PIP) é enviado em grupos de Whatsapp dos policiais que integram o batalhão. Com isso, o sistema gera um “ranking” dos PM’s que mais pontuaram e que é compartilhado para tos os militares. Os policiais que lideram o ranking podem receber “elogio, nota meritória, dispensa de serviço e menção elogiosa”.
Com isso, os policiais que pontuaram menos por alguma eventualidade, se sentem expostos diante dos colegas de farda. Rodrigues também afirma que a divulgação dos dados provoca um clima de competição entre os militares, o que não é saudável em um ambiente de trabalho, avalia o parlamentar.
Deputado alerta para o risco dos policiais só atenderem ocorrências que geram pontos
Rodrigues demonstra preocupação com a possibilidade dos policiais optarem por atender apenas ocorrências que geram pontos no sistema de metas.
“Se o pneu do carro da sua família furar às margens de uma rodovia, a PM tem a obrigação de parar, ajudar a sinalizar e garantir a sua segurança. No entanto, isso não gera pontos no sistema”, ressaltou.
O parlamentar complementa dizendo que há policiais que, pressionados pelo sistema de pontuação, podem abrir mão de atender este tipo de ocorrência e optarem por multar veículos em uma rodovia, por exemplo.
Comandante-geral da PM afirma que programa de metas é legal
O comandante-geral da Polícia Militar do Estado, coronel Rodrigo Piassi, afirma que o Programas Individuais de Produtividade estão respaldados pela lei.
“Os PIPs obedecem à Lei 14.310 e à Resolução 4220, que tem vinculação com as premiação, com as recompensas que a Polícia Militar aplica àqueles que extrapolam positivamente as suas atvidades. Nenhuma recompensa atribuída excede aquelas que a Resolução detemrina. O que os comandantes locais fazem é estabelecer metas para que a atuação da PM seja mais efetiva de acordo com suas funções momentâneas e específicas”, explicou.